Um grupo de 34 milhões de pessoas, com patrimônio constituído e bom poder de consumo. O potencial econômico do mercado grisalho é algo antigo. Apesar disso, a oferta de produtos e serviços específicos para esse público continua na primeira infância. Tanto é que apenas 30% das empresas afirmam planejar ações pensando no envelhecimento do público, segundo levantamento feito pela Economist Intelligence Unit. Quem se dedica a entender as necessidades dessa faixa etária, no entanto, não tem do que reclamar, uma vez que a atenção extra normalmente significa lucro certo.
Atenta ao envelhecimento do público consumidor, a Natura ampliou a linha anti-idade Chronos, que já contava com cosméticos nos segmentos 30, 45 e 60 anos. Os produtos para mulheres acima dos 70 respondem por 17% das vendas, cinco anos depois do lançamento. Quando somados aos itens para mulheres acima dos 60 anos, atingem 46% do consumo da linha e superam o creme mais pedido, o Chronos 45 (38%).
“Percebemos que mulheres com 60, 65 anos, estão recomeçando a vida, voltando a frequentar faculdade, viajando com as amigas. Elas estão bombando”, afirma a diretora global de Cosmética da Natura, Maria Paula Fonseca. “Como os filhos cresceram, elas ganharam autonomia novamente.” A executiva conta que nas pesquisas realizadas pela empresa para recriar a linha anti-idade ninguém fala em aposentadoria, mas sim em qualidade de vida, com saúde e energia. “Elas vão para a rua às vezes se sentindo mais livres do que nunca na vida”, conta a executiva.
Após o contato com o público para o relançamento de Chronos, houve mudança até na propaganda da Natura, que procurou relacionar a maquiagem a mulheres mais maduras. Para modelo foi escolhida Nathalie Chesnel, de 40 anos,
“Para o padrão das modelos de maquiagem, ela tem o dobro da idade”, afirma Maria Paula.
Além dos estudos internos, a Natura realizou uma parceria com a Nestlé e o Itaú para entender melhor o público idoso. A série batizada de Diálogos Viver Mais revelou que a gestão do bem-estar se torna prioridade a partir dos 70 anos. Dos 80 em diante, tudo o que a pessoa mais quer é ser autônoma e administrar os eventuais problemas de saúde que pode vir a ter.
Para a Nestlé, preservar a autonomia é realmente uma questão chave nesta fase da vida - e por isso mesmo, muito valorizada pelos idosos. Tanto que a empresa procura envolver esse público mais ativamente no desenvolvimento de produtos, como linhas de leite, aveia e suplementos nutricionais. Um desses complementos foi desenvolvido especialmente para pessoas acima dos 50 anos.
Gastos
Alimentos e higiene pessoal, como nos casos de Nestlé e Natura, estão justamente no foco do consumo do público maduro, ao lado de bebidas e produtos para casa no País. Quinze por cento do total de gasto com esses segmentos é feito pelos consumidores maduros, grupo que será responsável por impulsionar o consumo geral em 2,3% em 2017, de acordo com dados da pesquisa Winning The Future, da consultoria de mercado Kantar Worldpanel. O impulso será ligeiramente menor do que o das famílias com crianças pequenas (2,9%). Só que é preciso levar em consideração que essas famílias representam uma fatia maior da população (22%) que as pessoas maduras acima dos 50 anos (18%).
“Com certeza, o mercado de bens de consumo massivo está perdendo oportunidades importantes de se relacionar com esse público e ter suas vendas impulsionadas por ele”, avalia a responsável pela pesquisa, Maria Andréa Ferreira Murat, Marketing & Training Director da Kantar Worldpanel.
Conforme o perfil traçado pela Kantar, 92% dos maiores de 50 anos possuem imóvel próprio e 39% são donos de automóveis. Esse brasileiro quer praticidade, mas também está preocupado com o envelhecimento e com a sensação de bem-estar. Um terço dos consumidores maduros ainda acolhe filhos com mais de 29 anos dentro de suas casas.
O levantamento aponta algumas oportunidades para a experiência de compra dentro de lojas, como seções especiais para idosos, acesso adaptado, altura de exposição adequada, área de encontro e descanso, funcionários para apoio e informação e “atendimento preferencial que funcione”. Isso em lojas físicas. Mas também o consumidor maduro é cliente de lojas online. Sete em cada 10 idosos já fizeram compras na web, de acordo um mapeamento dos hábitos de compra da população acima de 60 anos em oito Estados brasileiros, realizada pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) de dezembro de 2016 a janeiro de 2017.
“Esse idoso está preocupado com atendimento, serviços e filas. O nível de influência digital na hora da compra tem sido semelhante aos jovens, assim como as reclamações para não comprar nas lojas físicas”, afirma Eduardo Terra, presidente da SBVC. Ainda de acordo com o estudo da SBVC, nas lojas físicas, o atendimento oferecido para pessoas com mais de 60 anos teve nota 6,6, com 41,9% dos entrevistados dando notas de 8 a 10.
A variedade de produtos específicos para esse público nas lojas, por sua vez, teve um desempenho ainda pior. Ficou com nota 5,8, mostrando claramente que os idosos não se sentem contemplados. “No que diz respeito a produtos de beleza, você até encontra”, diz a bancária aposentada Ana Macário, de 70 anos, moradora da cidade de Pederneiras (SP). “Mas se a gente vai a um supermercado, por exemplo, dificilmente vai encontrar uma banca ou prateleira especial para os idosos. ‘Melhor idade’ mesmo, só no nome.” Segundo ela, a situação fica mais complicada em localidades do interior, como a sua. “Falta investir muito em produtos para a nossa idade.”
Bem-estar e independência
De acordo com o levantamento da GfK, feito no ano passado, os idosos cuidam mais da saúde que a população em geral, focando especialmente nas horas de sono, higiene bucal, consumo de alimentos saudáveis, atividade física e em passar um tempo com a família e amigos. A grande maioria dos adultos acima dos 60 anos (87%) pratica exercícios físicos, sendo 32% deles todos os dias.
O setor de academias é um dos que estão mais atentos às necessidades dos idosos.Cinquenta e três por cento das academias do Rio e 65% das de São Paulo oferecem atividades específicas para eles, segundo a Associação Brasileira de Academias (ACAD). Na capital fluminense, por exemplo,o número de maiores de 60 anos matriculados saltou de 5% para cerca de 30% em dez anos.
Localizada em Moema, zona sul de São Paulo, a academia Vincere se especializou em fisioterapia e musculação terapêutica para pessoas a partir de 40 anos, em planos que custam a partir de R$ 490 e vão até R$ 1.980 por mês. O dono da academia, Carlos Pascotto, diz que resolveu investir nesse segmento depois que o seu sócio teve um acidente e perdeu a mobilidade de parte do corpo. “Já temos mais de 120 matriculados, identificamos um mercado crescente para esse público. Muitas academias só oferecem apenas um espaço reduzido para o idoso, resolvemos criar um local exclusivo.”
Também percebendo a falta de serviços e dicas para esse público, a procuradora aposentada Adriana Miranda resolveu criar, há um ano e meio, um blog e um perfil no Instagram relatando suas rotinas de treino na academia. Hoje, aos 61 anos, ela ficou conhecida na rede como “musa fitness aos 60”. Só no Instagram ela tem 200 mil seguidores.
Para Adriana, as pessoas não querem esperar chegar na terceira idade para começar a se preocupar com a saúde. “Pensava que público seria de mulheres acima dos 50 anos ou com 60 que nem eu, já entrando na menopausa, queria ajudá-las. Minha surpresa foi que, vendo as estatísticas do Instagram, a grande maioria são de 25 até 35 anos”, diz. Hoje ela planeja parcerias com restaurantes e empresas relacionadas a alimentos saudáveis.
Estratégia de marca
Com a dificuldade para cuidar de si próprios, os idosos acabam recorrendo a terceiros que nem sempre fazem parte da família. Os porteiros, por exemplo, são considerados os melhores amigos dos idosos, de acordo com pesquisa realizada pela Bradesco Seguros, em 2010, no bairro de Copacabana, no Rio. A região possui a maior concentração de idosos do país, com cerca de 30% de pessoas acima dos 60 anos.
O estudo resultou na criação do programa de capacitação Porteiro Amigo do Idoso que recebe investimentos anuais de aproximadamente R$ 1,2 milhão. O curso, com duração de 12 horas, já passou por 11 cidades brasileiras e treinou gratuitamente mais de 2700 profissionais para atender melhor à população idosa.
A metodologia de ensino aos porteiros foi desenvolvida pelo Senac do Rio e o curso já foi executado pela seguradora em cerca de 1500 condomínios. Até abril de 2018, a seguradora pretende oferecer o treinamento a mais 975 porteiros e manter o programa enquanto os condomínios demandarem, segundo o diretor executivo da Bradesco Seguros, Eugênio Velasques. “Além de oferecer produtos, as seguradoras têm essa obrigação de oferecer programas para promover mais bem-estar e segurança à sociedade. E como a empresa cresce neste contexto? Via construção da imagem da marca.”
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